Pode ser que corra bem

Ao chegar a Hamburgo, nem tablet nem internet para pesquisar por um hostel barato. Continuei às cegas e logo à frente encontro um, mais caro do que o normal, mas não havendo outro no horizonte terá de ser este.

Após instalação no quarto, entra um espanhol e conversámos um pouco. Explicou-me que estava ali, porque comprou um carro na Alemanha e queria levá-lo para a Espanha, mas antes tinha de preencher um formulário para obter a matrícula para a viatura. Não falava inglês nem alemão e pergunta-me se sei inglês. Ao responder que sim, pede-me ajuda para preencher o formulário, que afinal estava em alemão. De seguida pede-me para ir à receção com ele, para servir de intérprete. Assim o fiz, mas não foi fácil falar com alguém do hostel com disponibilidade para tal. Após um bocado, ainda começámos o processo, a receção lia em alemão e traduzia para inglês e eu tentava do inglês traduzir para portunhol. Mas como se tratava de um documento tão específico, eu só percebia metade do que me diziam e dessa metade, só outra lhe conseguia explicar. Valeu uma senhora que falava alemão e espanhol que depois o ajudou. Ainda bem pois estava a ver a coisa complicada.

No dia seguinte acordo com uma dores de barriga mas não liguei. Preparei-me para partir, mas quando chego à receção começa a chover. Ao esperar que a chuva pare, percebo que a dor de barriga afinal é uma cólica renal. A chuva parou e como já tive outras cólicas renais ao longo da vida que passaram passado pouco tempo pensei “Pode ser que corra bem”. Mas não correu, ainda pedalei uns metros mas tive de parar pois as dores estavam cada vez mais fortes. Após uma hora no chão a aguentar as dores e tentar perceber se a coisa passava, percebo que não e regresso ao hostel a pedir ajuda, onde de imediato chamaram uma ambulância. Peço para me guardarem a bike e lá vou eu no ti-nó-ni até ao hospital. As dores começaram às 9h e só pararam às 17h, umas vezes mais fortes que outras.

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Exames e análises feitas, revelam que tenho duas pedras, uma num rim e outra entre o rim e a bexiga e é essa que se está a portal mal. O médico aconselha-me a ficar, beber muita água e subir e descer as escadas do hospital para tentar que a pedra saia. Segui o seu conselho mas apenas no segundo dia, depois de as dores mais fortes terem passado. O hospital tem 9 pisos e 189 degraus e este foi o local onde passei grande parte dos dias. Do último piso consegue-se uma vista interessante sobre a cidade. A vontade de resolver o problema era tão grande que perdi o número de vezes que subi e descer aquelas escadas. Só nesse dia bebi 10 litros de água, um exagero, bastavam 3, disse mais tarde o médico.

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Nova ecografia mais tarde, revela que a pedra não se mexeu, mas a prática desportiva continuou até ao terceiro dia, mas mais moderada. Ao me registarem no sistema, lá mé acharam com cara de espanhol e durante as primeiras horas fui o Mister López.

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Deixei o hospital apenas no quarto dia, após nova ecografia ou ultra-sons (não sei se é a mesma coisa), mostrar que a pedra malvada desapareceu, mas eu não dei por nada. Resta uma no rim, mas essa deixo-a lá ficar. Os médicos aconselharam-me a ir para casa, mas para quê? Para ficar no sofá à espera de novas dores? Espero em cima da bicicleta.

Antes, ainda fui aos serviços administrativos, saber quanto iria pagar e desde o princípio percebi que iria ser um problema, pois ainda estava na ambulância e já me estavam a perguntar pela minha seguradora. Digo que não tenho, que apenas tenho o cartão europeu de saúde, mas ficou na bike. Já no hospital voltam a perguntar-me o mesmo e parecem não conhecer o cartão que falei. Durante a estadia até fui ler sobre o assunto e o site da União Europeia disponibiliza uma aplicação para telemóveis e tablets apenas sobre o cartão europeu de saúde, que nos ajuda a perceber o que temos direito nos outros países. Neste caso a apresentação do cartão cobriria a urgência, mas poderia pagar uma taxa fixa diária de internamento, 10% do custo dos medicamentos e 10% do custo do transporte da ambulância.

Chegada a minha vez e depois de ter ido buscar a bike, não foi à primeira que nos entendemos. A senhora teve de chamar outra funcionária que falava inglês. Assinei dois papéis e no fim a despesa foi de zero euros!!! Ainda voltei a perguntar “Mas não tenho de pagar nada?”, ” Não, vamos mandar a conta ao Passos Coelho”.

Ao regressar ao hostel de bike, onde decidi ficar mais uma noite para finalmente conhecer a cidade, um parafuso que suporta o porta-malas, parte. Problema resolvido para já, após sete abraçadeiras. Tenho de escrever um livro “Como resolver os problemas da vida com abraçadeiras e fita adesiva”.

“Se o caminho está difícil, é porque estou no bom caminho”.

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